CRISTO ORDENOU O ARREPENDIMENTO
Por: C.H. Spurgeon
“Arrependei-vos e crede no evangelho” (Marcos 1.15).
Nosso Senhor Jesus Cristo começou seu ministério anunciando suas principais ordens. Ungido recentemente, Ele saiu do deserto, como o noivo sai de sua câmara. As suas notas de amor são arrependimento e fé. Ele surge completamente preparado para exercer seu ofício, depois de permanecer no deserto e ser “tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb 4.15)... Escutai, ó céus, e dá ouvidos, ó terra, porque o Messias fala na grandeza de seu poder. Ele clama aos filhos dos homens: “Arrependei-vos e crede no evangelho”. Atentemos a essas palavras, que, como o seu Autor, estão cheias de graça e verdade. Diante de nós, temos o resumo e a essência de todo o ensino de Cristo, o alfa e o ômega de todo o seu ministério. Procedentes de lábios de tal Pessoa, naquele momento, com poder especial, devemos dar-lhes a mais sincera atenção. Que Deus nos ajude a obedecer a essas palavras, em nosso coração.
Devo começar observando que o evangelho pregado por Cristo era claramente uma ordem: “Arrependei-vos e crede no evangelho”. Nosso Senhor condescendeu em arrazoar. Às vezes, em seu ministério, Ele representou graciosamente o antigo texto: “Vinde, pois, e arrazoemos, diz o Senhor; ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve” (Is 1.18). Ele persuade os homens por meio de sua mensagem e de argumentos poderosos, que os levam a buscar a salvação de sua alma. O Senhor Jesus chama os homens. Oh! quão amavelmente Ele os convida a serem sábios! “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28). O Senhor Jesus roga aos homens; Ele condescende em tornar-se, por assim dizer, um pedinte às suas criaturas pecaminosas, implorando-as a vir. De fato, o Senhor Jesus faz disso a incumbência de seus ministros — “Somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus” (2 Co 5.20).
No entanto, vocês devem lembrar que, embora Ele tenha condescendido em arrazoar, persuadir, chamar e rogar, o evangelho tem, em si mesmo, a força e a dignidade de uma ordem. Se queremos pregar hoje como Cristo pregou, temos de proclamar o evangelho como uma ordem de Deus, acompanhada de sanção divina, que não deve ser negligenciada, exceto ao risco infinito da alma... “Arrependei-vos” é uma ordem de Deus, tal como o mandamento de “não roubarás” (Ex 20.15). “Crê no Senhor Jesus” possui tanta autoridade divina como “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento” (Lc 10.27).
Ó homens, não pensem que o evangelho é algo deixado a escolherem ou não, conforme acharem! Ó pecadores, não imaginem que podem desprezar uma Palavra do céu e não incorrer em culpa! Não pensem que podem negligenciar o evangelho, e nenhuma conseqüência má lhes sobrevirá. Essa negligência e desprezo aumenta a medida da iniqüidade de vocês. É a respeito disso que clamamos: “Como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação?” (Hb 2.3). Deus ordena que vocês se arrependam! O mesmo Deus diante de quem o Sinai se abalou e foi tomado por escuridão — esse mesmo Deus, que proclamou a Lei, com som de trombeta, com raios e trovões, falou-nos de modo mais gentil, porém divino, mediante seu Filho unigênito, quando disse: “Arrependei-vos e crede no evangelho”.
Devemos ressoar esse decreto de Deus a todas as nações da terra. Ó homens, Jeová, que os criou, que lhes dá respiração, a quem vocês têm ofendido, ordena-lhes que se arrependam hoje e creiam no evangelho...
Sei que alguns irmãos não gostam disso, mas não posso deixar de falar. Nunca serei escravo de sistemas, pois o Senhor removeu esses grilhões de ferro de meu pescoço. Agora sou um servo feliz da verdade que liberta. Quer ofenda, quer agrade, à medida que Deus me ajude, pregarei cada verdade como a aprendi da Palavra. Sei que, se há algo escrito na Bíblia, esta verdade está escrita com bastante clareza: Deus ordena, em Cristo, que os homens se arrependam e creiam no evangelho. Uma das provas mais tristes da depravação completa do homem é o fato de que ele não obedecerá esse mandamento; antes, rejeitará a Cristo e tornará a sua condenação mais grave do que a de Sodoma e Gomorra...
O evangelho é um mandamento, é um mandamento que se explica em duas ordens: “arrependei-vos e crede no evangelho”. Conheço alguns irmãos bem excelentes — aprouvera a Deus que houvesse mais desses irmãos — que, em seu zelo por pregar a fé simples em Cristo, têm sentido um pouco de dificuldade no assunto do arrependimento. Conheço alguns deles que tentaram remover a dificuldade abrandando a aparente severidade da palavra arrependimento, expondo-a de acordo com o termo grego equivalente e mais usual, um termo que ocorre no original grego de meu versículo e significa “mudar a mente”. Aparentemente, eles interpretam o arrependimento como algo mais brando do que o concebemos, uma mudança simples na maneira de pensar. Ora, desejo sugerir a esses queridos irmãos que o Espírito Santo nunca prega o arrependimento como uma trivialidade. A mudança na maneira de pensar e no entendimento, sobre a qual o evangelho fala, é uma obra mais profunda e solene e não deve ser depreciada por motivo algum.
Além disso, há outra palavra também usada no original grego que significa arrependimento; não é usada com freqüência, eu admito. Ela significa “uma preocupação posterior”, aproximando-se mais do sentido de tristeza ou ansiedade do que aquela que significa mudar a maneira de pensar. No verdadeiro arrependimento, deve haver tristeza e ódio para com o pecado; do contrário, li a minha Bíblia sem qualquer propósito... O arrependimento significa realmente uma mudança na maneira de pensar. Mas é uma mudança completa do entendimento e de tudo que está na mente. Por isso, inclui iluminação, a iluminação do Espírito Santo. Acho que inclui uma descoberta da iniqüidade e ódio para com o pecado, sem os quais não pode haver arrependimento autêntico. Penso que não devemos subestimar o arrependimento. É uma graça bendita de Deus, o Espírito Santo; é uma graça absolutamente necessária para a salvação.
A ordem explica-se a si mesma. Consideraremos, em primeiro lugar, o arrependimento. É certo que, mesmo não levando em conta o significado arrependimento neste versículo, ele é consistente com a fé. Portanto, de sua conexão com a próxima ordem — “Crede no evangelho” — obtemos a explicação quanto ao significado do arrependimento... Lembrem-se de que nenhum arrependimento é digno desse nome, se não é perfeitamente consistente com a fé em Cristo. Um antigo crente, em seu leito de enfermidade, usou esta admirável expressão: “Senhor, em arrependimento faze-me descer tão baixo como o inferno, mas” — eis a beleza de sua expressão — “em fé, ergue-me tão alto como o céu”. Ora, o arrependimento que faz um homem descer tão baixo como o inferno não serve para nada, se não houver a fé que o ergue tão alto como o céu! Os dois são perfeitamente coerentes. Um homem pode detestar e abominar a si mesmo e, ao mesmo tempo, saber que Cristo é poderoso para salvar e o salvou. De fato, é assim que os verdadeiros cristãos vivem. Eles se arrependem tão amargamente de seu pecado como se soubessem que deveriam ser condenados por causa do pecado cometido, mas se regozijam tanto em Cristo como se o pecado não fosse nada.
Oh! quão bendito é saber onde estas duas linhas se encontram, o despir do arrependimento e o vestir da fé. O arrependimento que despeja o pecado como um inquilino maligno e a fé que recebe a Cristo para ser um único Senhor do coração; o arrependimento que limpa a alma de obras mortas e a fé que enche a alma com obras vivas; o arrependimento que destrói e a fé que a edifica; o arrependimento que espalha pedras e a fé que ajunta pedras; o arrependimento que ordena um tempo de chorar e a fé que dá um tempo de saltar de alegria — essas duas coisas juntas constituem a obra da graça no íntimo pela qual a alma do homem é salva. Mas deve ficar estabelecido como grande verdade, escrita com bastante clareza em nosso versículo, o fato de que o arrependimento que devemos pregar está vinculado à fé. Assim, temos de pregar o arrependimento e a fé juntos, sem qualquer dificuldade...
Isso me traz à segunda metade do mandamento: “Crede no evangelho”. A fé significa confiança em Cristo. Ora, devo observar novamente que alguns têm pregado esta confiança em Cristo tão bem e de modo tão completo, que não posso senão admirar sua fidelidade e bendizer a Deus por eles. Contudo, há uma dificuldade e um perigo. Talvez, ao pregarem a simples confiança em Cristo como o meio de salvação, eles deixam de lembrar ao pecador que nenhuma fé é genuína se não é consistente com o arrependimento de pecados passados. O meu versículo parece dizer isso nos seguintes termos: nenhum arrependimento é verdadeiro, senão aquele que se harmoniza com a fé; nenhuma fé é verdadeira, senão aquela que está conectada com um arrependimento sincero e profundo de pecados passados.
Então, queridos amigos, aqueles que têm uma fé que lhes permite pensar levianamente sobre os pecados passados, esses têm uma fé dos demônios e não a fé dos eleitos de Deus... Têm uma fé que lhes permite viver de modo leviano, no presente. Eles dizem: “Bem, eu sou salvo por uma fé simples” e, em seguida, assentam-se na mesa de cerveja, com os bêbados, ou permanecem no bar com os ébrios, ou seguem companhias mundanas e desfrutam de prazeres carnais e da concupiscência da carne — eles são mentirosos. Não têm a fé que salva a alma. Têm uma hipocrisia enganosa; não têm a fé que os levaria ao céu.
Há outras pessoas que têm uma fé que não as leva ao ódio pelo pecado. Não sentem qualquer vergonha quando vêem o pecado dos outros. É verdade que não se comportariam como os outros se comportam, mas se alegram com o que eles fazem. Acham prazer nos erros dos outros, sorriem de suas atitudes profanas e de sua linguagem imprópria. Não fogem do pecado como se este fosse uma serpente, nem o detestam como o assassino de seu melhor amigo. Não. Elas flertam com o pecado. Cometem em privacidade o que condenam em público. Chamam as ofensas graves de erros leves e pequenas falhas. Nos negócios, elas fingem não ver afastamentos da retidão e consideram-nos apenas coisas do comércio. O fato, porém, é que elas têm uma fé que se assenta lado a lado com o pecado, come e bebe à mesma mesa com a injustiça. Oh! se vocês têm esse tipo de fé, peço a Deus que a retire de seu coração. Não lhes serve de modo algum! Quanto mais rápido se livrarem dela, tanto melhor será para vocês; pois, quando este fundamento de areia for removido, talvez comecem a edificar sobre a Rocha.
Meus queridos amigos, quero ser bastante fiel para com sua alma e atingir o seu coração. Qual é o seu arrependimento? Vocês têm o arrependimento que os faz olhar para fora de si mesmos, para Cristo, tão-somente para Cristo? Por outro lado, têm aquela fé que os leva ao verdadeiro arrependimento? Que os leva a odiar até o pensamento de pecado, de modo que desejam remover do trono o seu ídolo mais querido, não importa qual seja, para que adorem a Cristo, apenas a Cristo? Assegurem-se disto: nada aquém desse arrependimento lhes será proveitoso, no final. Um arrependimento e uma fé de outro tipo podes lhe agradar agora, como as crianças agradam-se com ilusões. Mas, quando chegarem ao leito de morte e perceberem a realidade das coisas, serão compelidos a dizer que seu arrependimento e sua fé eram uma falsidade e um refúgio de mentiras. Descobrirão que enganavam-se a si mesmos. Diziam a si mesmos: “Paz, paz”, quando não havia paz.
Digo, novamente, nas palavras de Cristo: “Arrependei-vos e crede no evangelho”. Confiem em Cristo para salvá-los, lamentem que ainda precisam ser salvos e que esta necessidade expôs o Senhor a vergonha pública, a sofrimentos pavorosos e a morte terrível.
Traduzido por: Wellington Ferreira
Copyright© Editora FIEL 2009.
C.H. Spurgeon (1834-1892) era pregador, autor e editor britânico. Foi pastor do Tabernáculo Batista Metropolitano, em Londres, desde 1861 até a data de sua morte. Fundou um seminário, um orfanato e editou uma revista mensal chamada “Sword on Trowel”. Conhecido como “Príncipe dos Pregadores”, Spurgeon escreveu muitos livros e artigos, particularmente na área devocional. Deixou um legado de vida piedosa, marcada por um profundo amor ao Senhor Jesus Cristo e por dedicados esforços ara alcançar almas perdidas.
“Arrependei-vos e crede no evangelho” (Marcos 1.15).
Nosso Senhor Jesus Cristo começou seu ministério anunciando suas principais ordens. Ungido recentemente, Ele saiu do deserto, como o noivo sai de sua câmara. As suas notas de amor são arrependimento e fé. Ele surge completamente preparado para exercer seu ofício, depois de permanecer no deserto e ser “tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb 4.15)... Escutai, ó céus, e dá ouvidos, ó terra, porque o Messias fala na grandeza de seu poder. Ele clama aos filhos dos homens: “Arrependei-vos e crede no evangelho”. Atentemos a essas palavras, que, como o seu Autor, estão cheias de graça e verdade. Diante de nós, temos o resumo e a essência de todo o ensino de Cristo, o alfa e o ômega de todo o seu ministério. Procedentes de lábios de tal Pessoa, naquele momento, com poder especial, devemos dar-lhes a mais sincera atenção. Que Deus nos ajude a obedecer a essas palavras, em nosso coração.
Devo começar observando que o evangelho pregado por Cristo era claramente uma ordem: “Arrependei-vos e crede no evangelho”. Nosso Senhor condescendeu em arrazoar. Às vezes, em seu ministério, Ele representou graciosamente o antigo texto: “Vinde, pois, e arrazoemos, diz o Senhor; ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve” (Is 1.18). Ele persuade os homens por meio de sua mensagem e de argumentos poderosos, que os levam a buscar a salvação de sua alma. O Senhor Jesus chama os homens. Oh! quão amavelmente Ele os convida a serem sábios! “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28). O Senhor Jesus roga aos homens; Ele condescende em tornar-se, por assim dizer, um pedinte às suas criaturas pecaminosas, implorando-as a vir. De fato, o Senhor Jesus faz disso a incumbência de seus ministros — “Somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus” (2 Co 5.20).
No entanto, vocês devem lembrar que, embora Ele tenha condescendido em arrazoar, persuadir, chamar e rogar, o evangelho tem, em si mesmo, a força e a dignidade de uma ordem. Se queremos pregar hoje como Cristo pregou, temos de proclamar o evangelho como uma ordem de Deus, acompanhada de sanção divina, que não deve ser negligenciada, exceto ao risco infinito da alma... “Arrependei-vos” é uma ordem de Deus, tal como o mandamento de “não roubarás” (Ex 20.15). “Crê no Senhor Jesus” possui tanta autoridade divina como “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento” (Lc 10.27).
Ó homens, não pensem que o evangelho é algo deixado a escolherem ou não, conforme acharem! Ó pecadores, não imaginem que podem desprezar uma Palavra do céu e não incorrer em culpa! Não pensem que podem negligenciar o evangelho, e nenhuma conseqüência má lhes sobrevirá. Essa negligência e desprezo aumenta a medida da iniqüidade de vocês. É a respeito disso que clamamos: “Como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação?” (Hb 2.3). Deus ordena que vocês se arrependam! O mesmo Deus diante de quem o Sinai se abalou e foi tomado por escuridão — esse mesmo Deus, que proclamou a Lei, com som de trombeta, com raios e trovões, falou-nos de modo mais gentil, porém divino, mediante seu Filho unigênito, quando disse: “Arrependei-vos e crede no evangelho”.
Devemos ressoar esse decreto de Deus a todas as nações da terra. Ó homens, Jeová, que os criou, que lhes dá respiração, a quem vocês têm ofendido, ordena-lhes que se arrependam hoje e creiam no evangelho...
Sei que alguns irmãos não gostam disso, mas não posso deixar de falar. Nunca serei escravo de sistemas, pois o Senhor removeu esses grilhões de ferro de meu pescoço. Agora sou um servo feliz da verdade que liberta. Quer ofenda, quer agrade, à medida que Deus me ajude, pregarei cada verdade como a aprendi da Palavra. Sei que, se há algo escrito na Bíblia, esta verdade está escrita com bastante clareza: Deus ordena, em Cristo, que os homens se arrependam e creiam no evangelho. Uma das provas mais tristes da depravação completa do homem é o fato de que ele não obedecerá esse mandamento; antes, rejeitará a Cristo e tornará a sua condenação mais grave do que a de Sodoma e Gomorra...
O evangelho é um mandamento, é um mandamento que se explica em duas ordens: “arrependei-vos e crede no evangelho”. Conheço alguns irmãos bem excelentes — aprouvera a Deus que houvesse mais desses irmãos — que, em seu zelo por pregar a fé simples em Cristo, têm sentido um pouco de dificuldade no assunto do arrependimento. Conheço alguns deles que tentaram remover a dificuldade abrandando a aparente severidade da palavra arrependimento, expondo-a de acordo com o termo grego equivalente e mais usual, um termo que ocorre no original grego de meu versículo e significa “mudar a mente”. Aparentemente, eles interpretam o arrependimento como algo mais brando do que o concebemos, uma mudança simples na maneira de pensar. Ora, desejo sugerir a esses queridos irmãos que o Espírito Santo nunca prega o arrependimento como uma trivialidade. A mudança na maneira de pensar e no entendimento, sobre a qual o evangelho fala, é uma obra mais profunda e solene e não deve ser depreciada por motivo algum.
Além disso, há outra palavra também usada no original grego que significa arrependimento; não é usada com freqüência, eu admito. Ela significa “uma preocupação posterior”, aproximando-se mais do sentido de tristeza ou ansiedade do que aquela que significa mudar a maneira de pensar. No verdadeiro arrependimento, deve haver tristeza e ódio para com o pecado; do contrário, li a minha Bíblia sem qualquer propósito... O arrependimento significa realmente uma mudança na maneira de pensar. Mas é uma mudança completa do entendimento e de tudo que está na mente. Por isso, inclui iluminação, a iluminação do Espírito Santo. Acho que inclui uma descoberta da iniqüidade e ódio para com o pecado, sem os quais não pode haver arrependimento autêntico. Penso que não devemos subestimar o arrependimento. É uma graça bendita de Deus, o Espírito Santo; é uma graça absolutamente necessária para a salvação.
A ordem explica-se a si mesma. Consideraremos, em primeiro lugar, o arrependimento. É certo que, mesmo não levando em conta o significado arrependimento neste versículo, ele é consistente com a fé. Portanto, de sua conexão com a próxima ordem — “Crede no evangelho” — obtemos a explicação quanto ao significado do arrependimento... Lembrem-se de que nenhum arrependimento é digno desse nome, se não é perfeitamente consistente com a fé em Cristo. Um antigo crente, em seu leito de enfermidade, usou esta admirável expressão: “Senhor, em arrependimento faze-me descer tão baixo como o inferno, mas” — eis a beleza de sua expressão — “em fé, ergue-me tão alto como o céu”. Ora, o arrependimento que faz um homem descer tão baixo como o inferno não serve para nada, se não houver a fé que o ergue tão alto como o céu! Os dois são perfeitamente coerentes. Um homem pode detestar e abominar a si mesmo e, ao mesmo tempo, saber que Cristo é poderoso para salvar e o salvou. De fato, é assim que os verdadeiros cristãos vivem. Eles se arrependem tão amargamente de seu pecado como se soubessem que deveriam ser condenados por causa do pecado cometido, mas se regozijam tanto em Cristo como se o pecado não fosse nada.
Oh! quão bendito é saber onde estas duas linhas se encontram, o despir do arrependimento e o vestir da fé. O arrependimento que despeja o pecado como um inquilino maligno e a fé que recebe a Cristo para ser um único Senhor do coração; o arrependimento que limpa a alma de obras mortas e a fé que enche a alma com obras vivas; o arrependimento que destrói e a fé que a edifica; o arrependimento que espalha pedras e a fé que ajunta pedras; o arrependimento que ordena um tempo de chorar e a fé que dá um tempo de saltar de alegria — essas duas coisas juntas constituem a obra da graça no íntimo pela qual a alma do homem é salva. Mas deve ficar estabelecido como grande verdade, escrita com bastante clareza em nosso versículo, o fato de que o arrependimento que devemos pregar está vinculado à fé. Assim, temos de pregar o arrependimento e a fé juntos, sem qualquer dificuldade...
Isso me traz à segunda metade do mandamento: “Crede no evangelho”. A fé significa confiança em Cristo. Ora, devo observar novamente que alguns têm pregado esta confiança em Cristo tão bem e de modo tão completo, que não posso senão admirar sua fidelidade e bendizer a Deus por eles. Contudo, há uma dificuldade e um perigo. Talvez, ao pregarem a simples confiança em Cristo como o meio de salvação, eles deixam de lembrar ao pecador que nenhuma fé é genuína se não é consistente com o arrependimento de pecados passados. O meu versículo parece dizer isso nos seguintes termos: nenhum arrependimento é verdadeiro, senão aquele que se harmoniza com a fé; nenhuma fé é verdadeira, senão aquela que está conectada com um arrependimento sincero e profundo de pecados passados.
Então, queridos amigos, aqueles que têm uma fé que lhes permite pensar levianamente sobre os pecados passados, esses têm uma fé dos demônios e não a fé dos eleitos de Deus... Têm uma fé que lhes permite viver de modo leviano, no presente. Eles dizem: “Bem, eu sou salvo por uma fé simples” e, em seguida, assentam-se na mesa de cerveja, com os bêbados, ou permanecem no bar com os ébrios, ou seguem companhias mundanas e desfrutam de prazeres carnais e da concupiscência da carne — eles são mentirosos. Não têm a fé que salva a alma. Têm uma hipocrisia enganosa; não têm a fé que os levaria ao céu.
Há outras pessoas que têm uma fé que não as leva ao ódio pelo pecado. Não sentem qualquer vergonha quando vêem o pecado dos outros. É verdade que não se comportariam como os outros se comportam, mas se alegram com o que eles fazem. Acham prazer nos erros dos outros, sorriem de suas atitudes profanas e de sua linguagem imprópria. Não fogem do pecado como se este fosse uma serpente, nem o detestam como o assassino de seu melhor amigo. Não. Elas flertam com o pecado. Cometem em privacidade o que condenam em público. Chamam as ofensas graves de erros leves e pequenas falhas. Nos negócios, elas fingem não ver afastamentos da retidão e consideram-nos apenas coisas do comércio. O fato, porém, é que elas têm uma fé que se assenta lado a lado com o pecado, come e bebe à mesma mesa com a injustiça. Oh! se vocês têm esse tipo de fé, peço a Deus que a retire de seu coração. Não lhes serve de modo algum! Quanto mais rápido se livrarem dela, tanto melhor será para vocês; pois, quando este fundamento de areia for removido, talvez comecem a edificar sobre a Rocha.
Meus queridos amigos, quero ser bastante fiel para com sua alma e atingir o seu coração. Qual é o seu arrependimento? Vocês têm o arrependimento que os faz olhar para fora de si mesmos, para Cristo, tão-somente para Cristo? Por outro lado, têm aquela fé que os leva ao verdadeiro arrependimento? Que os leva a odiar até o pensamento de pecado, de modo que desejam remover do trono o seu ídolo mais querido, não importa qual seja, para que adorem a Cristo, apenas a Cristo? Assegurem-se disto: nada aquém desse arrependimento lhes será proveitoso, no final. Um arrependimento e uma fé de outro tipo podes lhe agradar agora, como as crianças agradam-se com ilusões. Mas, quando chegarem ao leito de morte e perceberem a realidade das coisas, serão compelidos a dizer que seu arrependimento e sua fé eram uma falsidade e um refúgio de mentiras. Descobrirão que enganavam-se a si mesmos. Diziam a si mesmos: “Paz, paz”, quando não havia paz.
Digo, novamente, nas palavras de Cristo: “Arrependei-vos e crede no evangelho”. Confiem em Cristo para salvá-los, lamentem que ainda precisam ser salvos e que esta necessidade expôs o Senhor a vergonha pública, a sofrimentos pavorosos e a morte terrível.
Traduzido por: Wellington Ferreira
Copyright© Editora FIEL 2009.
C.H. Spurgeon (1834-1892) era pregador, autor e editor britânico. Foi pastor do Tabernáculo Batista Metropolitano, em Londres, desde 1861 até a data de sua morte. Fundou um seminário, um orfanato e editou uma revista mensal chamada “Sword on Trowel”. Conhecido como “Príncipe dos Pregadores”, Spurgeon escreveu muitos livros e artigos, particularmente na área devocional. Deixou um legado de vida piedosa, marcada por um profundo amor ao Senhor Jesus Cristo e por dedicados esforços ara alcançar almas perdidas.
(Extraído de http://www.editorafiel.com.br).
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