ENTRE VERDADES E PEIXES CRUS

Por: Rev. Jônatas Abdias

Eu gosto de peixe cru. Sei que é um tanto cru dizer isto de cara. Nem todos gostam, e até os que gostam preferem seu nome mais sofisticado: sashimi! Como bom apreciador da culinária oriental, e em particular da japonesa, gostar de alimentos crus faz parte do pacote.

Mas concordemos: nem tudo é bom cru! A certas coisas que se tornam verdadeiras delícias depois de bem preparadas. Quando falamos de comida e culinária, isto se torna um fato auto evidente. Mas... e se o assunto for outro?

Jay Adams, em seu livro "Pulpit Speech", diz com particular vivacidade: "Pregadores não precisam tornarem-se açougueiros bíblicos, cortanto fora grandes pedaços de bifes escriturísticos e jogando-os crus e ensangüentados para a sua congregação como se estivessem alimentados tigres. Não há nada de errado com o bife. Não há nada e errado com o trabalho do açougueiro. Mas pregadores deveriam também aprender a tornarem-se cozinheiros tão bons quantos são açougueiros. Eles precisam aprender a servir o bife bem cozido, quente, bem temperado, suculento... A maioria das congregações se engasga e silencia com a fatia de doutrina crua, mesmo que seja um excelente corte. O pregador como açougueiro faz a pesquisa; o pregador como cozinheiro e anfitrião apresenta seu material em forma palatável, digestível e convidativa".

Vivemos dias maus. Preocupados com a triste condição de subnutrição bíblica e espiritual que as ovelhas de Cristo se encontram atualmente, pastores zelosos procuram de maneira fiel e dedicada suprir essas ovelhas da maneira mais completa e profunda. Conquanto saibamos que o alimento está correto, e o zelo deva ser elogiado, a apresentação carece de cuidado e atenção especial.

Não é incomum encontrar quem já tenha ouvido uma explicação atravessada e desajeitada de alguma verdade bíblica e ter alimentado algum receio, justamente pelo modo como ela foi passada. Alguns reagiriam indignados: "...como podem achar eles que a verdade da Palavra possa ser rejeitada, em alguma medida!!!" Na verdade, a verdade da Palavra de fato não é. Ela é boa, perfeita e ... agradável. É assim que a Bíblia retrata ser a vontade revelada do Senhor Deus. Certamente que poderíamos concordar que boa e perfeita ela seja; mas encontramos aqueles que têm dificuldades de entender o caráter agradável que a Palavra possui...

Precisamos rever o modo como transmitimos a verdade. Não é somente uma mensagem sobre graça que carregamos nos lábios, mas igualmente uma mensagem cuja graciosidade já se possa ver na maneira como a entregamos. Antes que objetem, é bom lembrar que a eficácia da mensagem reside em seu conteúdo. A formosura, beleza, estilo ou retórica não determinam o êxito da mensagem. Jonas, o profeta, e seu livro, evidenciam esta questão. Porém, lemos mais na Bíblia.

Lemos em Efésios 4.29 que de nossa boca (daqueles que despojados do velho homem, agora renovados pelo Espírito, revestem-se do novo homem segundo Deus) devem sair palavras que possam "transmitir graça aos que ouvem". Antes que se levante nova objeção, é bom lembrar que esta é uma verdade espalhada na Escritura: a de que devemos levar doçura no falar! Lembremos, por exemplo, das palavras do sábio que, em Provérbios, diz que a "palavra branda desvia o furor" e "Como maçãs de ouro em salvas de prata, assim é a palavra dita a seu tempo".

Mas o que me chama a atenção é a questão da beleza estilística, evidenciada no adorno que é dado ao conhecimento: "A língua dos sábios adorna o conhecimento..." (Pv. 15.2) Uma vez que a Escritura nos diz que devemos levar a "verdade em amor", não é de estranhar a questão.

Ser agradável não quer dizer, primeiro, que a mensagem será torcida para agradar, nem que não haverá reprovação do pecado e ameaças de punição vindas de Deus... Antes, é preparar com cuidado o que se vá dizer, de modo a fazê-lo de modo mais profundo, para que o que ouve, ouça na profundidade de seu coração.

As pessoas vão amar doutrinas como a da eleição, vão se deleitar nas verdades da providência e vão vibrar, como cordas afinadas de um violão angelical, diante da majestade divina revelada na doutrina da soberania! Aos pregadores da Palavra bastará que gastem mais tempo lapidando seus ensinos, de modo que além de possuir conteúdo, também possuam beleza.

Entre verdades e peixes crus, prefiro o peixe. A verdade é bela, doce e brilhante! A verdade liberta... Haverá sempre duas formas de dizer esta verdade: a crua e a bem preparada. A verdade, mudando de figura, é uma jóia preciosa: Mesmo sem lapidar ela continua preciosa, mas sua beleza só aparece após a lapidação.

Entre o açougueiro e o cozinheiro, sejamos como o cozinheiro. Neste estágio sabemos que a carne já foi cortada. No outro, isso não importa. Mas aos que vão se alimentar das nossas palavras, será sempre importante saber se nossa verdade está bem ou mal passada.

Extraído de http://pensamentocativo.blogspot.com/2009/01/verdades-e-peixes-crus.html e publicado com permissão do autor.

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